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Dique da Vila Gilda: Novo incêndio, velhos problemas

  • Foto do escritor: Carlos Norberto Souza
    Carlos Norberto Souza
  • 29 de ago.
  • 6 min de leitura

A comunidade do Caminho São Sebastião novamente agiu como pode para ajudar no combate ao fogo e o atendimento às vítimas, menos de um mês desde o incêndio de 1º de agosto. Representantes do Poder Público buscam mostrar serviço, mas será que a história vai se repetir?


Foto: Douglas dos Anjos/Jovens Pela ZN
Foto: Douglas dos Anjos/Jovens Pela ZN


Na tarde desta quinta-feira (28/08), o Dique da Vila Gilda foi atingido por outro incêndio que, desta vez, atingiu as moradias de cerca de 178 famílias, que, segundo a Prefeitura, já foram cadastradas pelo Centro de Referência e Assistência Social (Cras) do Rádio Clube e estão sendo atendidas pela Secretaria de Desenvolvimento Social de Santos. O Centro Esportivo da Zona Noroeste (Dale Coutinho) foi disponibilizado para acolhimento se necessário.


Mais uma vez, a comunidade do Caminho São Sebastião agiu como pode para ajudar no combate ao fogo e o atendimento às vítimas do incêndio (que começou por volta das 13h30), ao lado das equipes do Corpo de Bombeiros e da Defesa Civil, entre outros serviços de emergência. Não completou ainda um mês desde o incêndio de 1º de agosto, que destruiu cerca de 100 moradias e causou a morte da moradora Sandra Sarmento da Silva, 64 anos.  


A ZNO em Pauta ouviu de moradores relatos sobre as dificuldades de acesso dos bombeiros ao fogo e da falta de água em parte dos hidrantes localizados na área. Um integrante do Corpo de Bombeiros disse que, apesar da boa vontade, a falta de preparo de moradores sobre a forma de agir nessas situações também causa transtornos durante o combate ao incêndio, como o bloqueio ou corte do fluxo de água das mangueiras.


Ainda no calor do momento, o clima de indignação era concreto e a noção de que a comunidade precisa exigir do Poder Público ações efetivas para evitar novas tragédias. "Temos que cobrar desses engravatados que vem aqui nessa horas", afirmou um dos moradores.


Ele se referia aos representantes do Poder Público, como Elias Júnior, secretário de Desenvolvimento Social, Nina Barbosa, secretária da Mulher, Cidadania, Diversidade e Direitos Humanos, e da vice-prefeita Audrey Kleys, que circularam pelo Caminho São Sebastião para tentar mostrar serviço à população, além de alguns vereadores que também lá estiveram.


Em uma entrevista à imprensa em frente ao Ceconv Rádio Clube (antigo Centro da Juventude), Audrey informou que, em reunião dela com o Corpo de Bombeiros, Defesa Civil e alguns membros da Zona Noroeste, foi discutida a implantação de uma estrutura e capacitação por meio de uma brigada de incêndio. "Desde janeiro, o Corpo de Bombeiros já está fazendo um pensamento todo voltado a essa questão da brigada e pontos estratégicos de capacitação".


Jovens Pela ZN


Segundo o educador social Douglas dos Anjos, representante do Coletivo Jovens Pela ZN, é possível a criação de brigada comunitária cuja implantação integre comunidade, governo, setor privado e sociedade civil na prevenção e combate a incêndios. Ele se inspira na Lei Federal nº 14944, de 31 de julho de 2024, que institui a Política Nacional de Manejo Integrado do Fogo no campo e nas florestas. "Não podemos fazer algo assim também no mangue e nas palafitas?"


A proposta deste coletivo é a implementação de uma política pública que envolva a verificação das moradias para avaliação de riscos de incêndio, capacitar dois ou mais moradores por becos e vielas com formação contínua, apoio psicológico, protagonismo cidadão e a garantia de uma bolsa mensal e cesta básica, tendo como contrapartida à prestação de contas sobre as ações executadas. "Desde 2017, estamos reivindicando que seja feita uma política efetiva para que as pessoas parem de perder sua vida, história e dignidade", afirmou.


Inclusão das pessoas


A vereadora Débora Camilo (PSOL) considera fundamental a criação e execução de um plano de contingência que inclua as pessoas. "Eu sei que a comunidade já tem se organizado pela falta do Estado atuar. Uma das questões colocadas é o hidrante e uma bomba em locais específicos que, muitas vezes, a falta disso faz com que não se consiga de forma rápida apagar os focos de incêndio".


Para ela, a Prefeitura precisa atuar junto com a Sabesp, Corpo de Bombeiros e a comunidade, que conhece a realidade e que precisa também indicar os pontos que isso precisaria ser instalado.


Não adianta ficar só falando


"A gente precisa fazer uma coisa pra ontem. O que é possível pra ontem? Um motor num barco para puxar a água da maré. Isso é imediato, começou a pegar fogo, põe o barco dentro da água, que vai estar lá com os pescadores, e já vai jogando água", afirma o vereador Marcos Caseiro (PT), que também defende a realização de reuniões periódicas com moradores para a criação de uma brigada


Caseiro afirmou a ZNO em Pauta que comprou com recursos do seu mandato uma bomba de água. "Já está lá, já estamos arrumando para ela ter uma boia para ser puxada por um barco. Tem que fazer as coisas acontecendo, não adianta ficar só falando, vem a tragédia e a coisa não anda", criticou.


Moradia digna x Déficit


O vereador também tocou na questão da moradia, que é uma transformação de longo prazo. "Mas precisa ser para ontem também. Quanto tempo tem isso aqui esses caras estão no governo há 30 anos e ninguém viu essas palafitas? Nós não temos tecnologia para construir moradia digna? É uma vergonha. Isso é falta de empenho e de vontade política", desabafou.


Em Santos, existe um projeto-piloto de urbanização em andamento chamado Parque Palafitas que busca, na fase inicial, a construção de 60 habitações no Dique da Vila Gilda, em área cedida à Prefeitura pelo Governo Federal. "É mais caro construir no mangue do que readequar os prédios do centro. Além de muito mais caro, esse projeto tem um impacto ambiental e a gente sabe que o número de habitações que provavelmente será construída, não é suficiente. O dinheiro a ser gasto com o Parque Palafitas poderia ser repensado para atingir maior número de pessoas", opinou a psolista.


O Governo Federal repassou quase R$120 milhões para reurbanização da área atingida pelo incêndio anterior e a compra de moradias às famílias. "E agora a gente tem mais esse triste evento que precisa ter uma política pública de habitação para zerar o déficit habitacional das palafitas e demais áreas de risco. A gente precisa avançar muito. Mas falta interesse do Governo do Estado e da Prefeitura", considera.


O Parque Palafitas é defendido pela Prefeitura como um plano de urbanização inédito no País que pretende estabelecer uma nova forma de ocupação em área de mangue. Hoje, em Santos, faltam cerca de 30 mil moradias para atender a demanda e zerar o déficit.


História que se repete?


Em breve pesquisa no site da Câmara, é possível saber que, em 2003, uma comissão de vereadores - coordenada pela então vereadora Cassandra Maroni - elaborou um plano que previa uma série de medidas de prevenção e combate a incêndios nessas áreas. Um projeto piloto foi desenvolvido na Vila Butantã, com incluiu aulas sobre prevenção e combate a incêndios e primeiros socorros, ação preventiva para cada possível causa, noções de cidadania, conscientização e educação.


À época, o plano previa melhorar os acessos, a instalação de rede especial com hidrantes, "estações de combate" e reforma de instalações elétricas, envolvendo bombeiros, moradores, Sabesp e CPFL. Até foi realizada audiência pública sobre o tema alguns anos depois, o objetivo seria ampliar o projeto piloto da Vila Butantã para evitar novas tragédias. Para Cassandra, o tema mereceria maior atenção da Câmara e do Ministério Público, que deveriam cobrar da Prefeitura "a adoção de um plano preventivo a fim de evitar que este tipo de ocorrência se transforme em rotina na Cidade".


Infelizmente, isso virou rotina e coloca em risco trabalhadores e trabalhadoras todos os dias.


Solidaridade


Um dos pontos de doação é a sede do time de futebol Terror F.C, que está arrecadando alimentos, produtos de higiene, água, colchões e roupas de cama, entre outros itens que podem ser entregues no Caminho São Sebastião, 93. Também está sendo organizada uma cozinha solidária no local.


A Defesa Civil do Estado enviou colchões, kits de higiene e cestas básicas.


Foi anunciado que a unidade Vila Gilda do restaurante Bom Prato estará aberta a partir hoje para oferecer 300 refeições diárias (café da manhã, almoço e jantar).


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Publicado originalmente em www.zonanoroesteempauta.com.br

            

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